sábado, 5 de janeiro de 2013

O ARTIGO 258-A DO CPC NO PROCESSO TRABALHISTA: Uma Analise Prática e Crítica

Obs.: Artigo originalmente publicado na revista Justiça do Trabalho - Abril/2011
RODRIGO UNGARETTI TAVARES[1]

  
INTRODUÇÃO


Inicialmente, a Lei n° 11.277/2006 inovou trazendo o novo artigo 285-A ao Código de Processo Civil, no qual, em um superficial resumo, foi permitido aos magistrados decretarem a total improcedência de demandas que tratem de matéria apenas de direito e que já tenham sido apreciadas ações semelhantes outras tantas vezes pelo juiz.

A problemática proveniente da mencionada alteração foi a respeito dos reflexos dessas inovações do Código de Processo Civil na Justiça Laboral, ou seja, se é proveniente ou não a possibilidade de uso deste mecanismo na Justiça do Trabalho.

A partir de debates e da própria prática forense se chega a conclusões diferentes, baseados em argumentações de correntes opostas, entretanto todas com fundamentos jurídicos convincentes.

O presente trabalho se propõe a analisar a prática trabalhista e seus conceitos, fontes e princípios, bem como a utilização subsidiária do Código de Processo Civil nesta prática. Das discussões a cerca dessas correntes doutrinárias procura-se buscar um denominador comum, calcando-se nos aspectos legais, formais, especificidades da Justiça do Trabalho e do bom senso na aplicação das normas existentes – alcançando a harmonia entre a prática trabalhista, os seus princípios e as inovações do Código de Processo Civil.

Não se tem a pretensão de encerrar o tema, e sim de lançá-lo para reflexões dos operadores do direito e, quem sabe, contribuir com a conclusão para um denominador mais justo e correto.

1. AS MUDANÇAS DO CPC E SEUS REFLEXOS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Como bem afirmou Laurino (2005), no ano de 2005 e início de 2006 foram introduzidas no Processo Civil consideráveis alterações no sistema normativo vigente à época. Foram leis que surgiram frente à necessidade de simplificar e acelerar os atos destinados à satisfação do direito proveniente de sentença judicial – uma vez que a antiga sistemática deixava muito lenta a prestação jurisdicional, prejudicando ainda mais a parte vencedora da lide, ou seja, a parte inicialmente prejudicada.

Segundo o autor, entre as alterações indicadas, destacam-se as seguintes: a Lei n° 11.132, que veio a acabar com a separação entre processo de conhecimento e processo de execução, ao invés de criar um processo autônomo para executar o determinado em sentença, foi criada a figura do “cumprimento de sentença”, onde a execução acontece por simples petição nos autos do processo de conhecimento, em resumo.

A segunda lei a ser mencionada é a Lei nº 11.276, que introduziu o § 4º no art. 515 do CPC e, ainda, o §1º ao artigo 518 do mesmo diploma legal. Na prática, houve as seguintes mudanças, respectivamente: foi permitido ao Tribunal determinar a prática de atos processuais que visem sanar eventuais nulidades, permitindo o julgamento do mérito e, ainda, determina ao juiz de primeira instância que não conheça os recursos de apelação contra sentenças que estiverem de acordo com súmulas do STJ e STF (LAURINO, 2005)

Também se faz necessário apontar a Lei nº 11.280, que tratou de inúmeros assuntos relativos ao reconhecimento de incompetência relativa, prescrição de ofício, meios eletrônicos de comunicação dos atos processuais, entre outros.

Finalmente, disse Laurino, deve-se assinalar a Lei n° 11.277, de 07 de fevereiro de 2006, que nos remete a problemática do presente artigo. Foi incluído o art. 285-A do Código de Processo Civil, que criou a possibilidade do decreto liminar de improcedência de demandas repetitivas, desde que a matéria seja unicamente de direito e que no juízo já tenha sido proferida repetidas sentenças de total improcedência em outros casos idênticos. Nesses casos, pode ser dispensada a citação e proferida a sentença de plano.

Antes de analisarmos o tema proposto propriamente dito, deve-se adentrar em alguns aspectos introdutórios sobre essas mudanças que refletem no Processo do Trabalho.

Ainda segundo Laurino:

 É necessário lembrar de uma lição muito importante de direito processual, que é a premissa metodológica da unidade fundamental do direito processual. (...) A ordem jurídica é um sistema hierarquizado de normas, em cujo vértice está a Constituição, e que se desdobra em dois sistemas jurídicos autônomos e interdependentes que são o direito material e o direito processual (...).

Sabe-se que existe uma premissa metodológica de unidade do direito processual, ou seja, significa dizer que mesmo com todas as diferenças existentes entre os mais diversos ramos do direito processual, todos eles tem algo em comum, todos eles bebem da mesma fonte. Esse núcleo jurídico comum é formado por regras agrupadas em torno dos mesmos institutos jurídicos, pelos mesmos princípios e em busca de uma mesma finalidade.

Bezerra Leite (2005) afirma que são os princípios jurídicos que dão coerência ao sistema, e que alguns desses são divididos entre o processo comum e o trabalhista. Por mais que existam peculiaridades que os distingam, na verdade essa unicidade principiológica já existia, tanto que o CPC sempre foi usado subsidiariamente na pratica laboral.

O art. 769 da CLT determina:  nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo que for incompatível com as normas deste título.

Nas palavras de Paes de Almeida (2009), “inexistindo um Código de Processo do Trabalho, injustificável omissão do legislador, as lacunas existentes na CLT autorizam aplicação subsidiária do Código de Processo Civil”.

Sendo assim, com base nos princípios trabalhistas em confronto com as normas cíveis é que se fará a partir de agora a analise da possibilidade do uso do art. 285-A na prática trabalhista, se for compatível com a CLT e com os princípios do Processo do Trabalho.

2. DA APLICABILIDADE DO ARTIGO 285-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NA SEARA TRABALHISTA

Inicialmente, conforme supramencionado, a Lei nª 11.277/2006 inovou a prática processual criando artigo 285-A do Código de Processo Civil. Conforme já explicamos resumidamente, por força deste novo artigo foi inaugurado um novo procedimento na esfera cível, qual seja, foi permitido aos magistrados decretarem a total improcedência de demandas que tratem de matéria apenas de direito e que compartilhem da mesma causa de pedir e que já tenham sido apreciadas ações semelhantes outras tantas vezes pelo juiz.

Assim, segundo Laurino (2005), tal artigo em comento evitaria a execução de atos processuais dispensáveis quando o Magistrado já tenha de pronunciado reiteradamente pela improcedência da pretensão em ações anteriores, garantindo dessa forma a celeridade e economia processual.

A problemática proveniente da mencionada alteração que buscamos resolver é a respeito dos reflexos dessas inovações do Código de Processo Civil na Justiça Laboral, ou seja, se é proveniente ou não a possibilidade de uso deste mecanismo na Justiça do Trabalho.

A partir da analise dos discursos dos defensores de cada tese e dos debates oriundos da própria prática forense se chega, primeiramente, a conclusões diferentes em regra, baseados em argumentações de correntes opostas, entretanto todas com fundamentos jurídicos e práticos convincentes. O caminho a ser trilhado pelo presente trabalho é encontrar a regra geral, mesmo que existam – e sempre existirá – exceções que destoem da conclusão principal (LAURINO, 2005).

Passamos a analise do mencionado artigo:

Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
§ 1o Se o autor apelar, e facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.
§ 2o Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

Segundo as afirmações de Prata (2009), desse artigo podemos retirar os principais requisitos para que tal situação ocorra:

a.          Matéria exclusiva de direito;
b.          Tese de improcedência;
c.          Aplicação iterativa da tese.

A partir de uma analise desses requisitos, Rodrigues Pinto apud Prata, sugeriu que o novo artigo tratava-se na verdade de uma “sumula vinculante de primeiro grau”, uma vez que o magistrado tem o direito de extinguir um processo com resolução de mérito (art. 269, I do CPC) de forma liminar e inautita altera pars.

Afirma Prata que logo após a introdução do aludido dispositivo no nosso ordenamento jurídico, houve manifestações contrarias a sua criação e, inclusive, a Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou ação direta de inconstitucionalidade que tramita no STF sob o n° 3.965/2006 sob os seguintes fundamentos: garantia do acesso ao judiciário (art. 5°, XXXV, CF/88), simetria de tratamento processual, uma vez que o instituto favoreceria, em tese, apenas os réus, direito à ampla defesa (art. 5°, LV, CF/88), devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/88).

Nos dizeres de Laurino:

 Não comungamos dessa percepção. Institutos como o julgamento superantecipado da lide, a antecipação de efeitos da tutela de mérito ou mesmo as liminares cautelares inaudita altera pars não ferem quaisquer princípios constitucionais, embora não se alinhem ex perfecto com o modelo liberal formal de processo civil (...). Acompanhamos assim Ada Pelegrini Grinover, Nelson Nery Junior, José Augusto Rodrigues Pinto, entre outros autores que não divisaram, no art. 255-A, qualquer inconstitucionalidade.

Sendo assim, pode-se concluir pela perfeita sintonia do mencionado artigo a prática processual cível com a Constituição Federal. Neste quesito, ao menos, não há qualquer irregularidade na alteração legislativa. Entretanto, esbarra-se no seguinte questionamento: o art. 285-A é aplicável na Justiça Trabalhista com base no art. 769 da CLT?

De acordo com Laurino (2005) tal procedimento em regra não seria possível na Justiça do Trabalho, uma vez que o artigo 285-A do CPC prevê que “quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.”

Para o autor:  “Doutrina e jurisprudência ainda não formaram uma tendência a este respeito. Assim, há interpretações bastante variadas”.

Entretanto, afirma ele, embora considere inadmissível tal procedimento na justiça laboral, haveria exceções a regra. Seria um exemplo clássico dessa situação os casos de repetidas demandas postulando o pagamento de diferenças decorrentes dos expurgos da correção monetária causados pelos planos econômicos de 1989 e 1990. Primeiro nos salários e depois na indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS. Matérias idênticas e que mereceriam um tratamento igualitário pelo juízo.

Por outro lado, ainda segundo o autor, para muitos juristas nessas hipóteses acima elencadas também não seria legítimo o juiz decretar liminarmente a improcedência do pedido em vista de sentenças já proferidas em situações idênticas uma vez que a regra enfocada seria incompatível com os procedimentos do processo de conhecimento da Consolidação das Leis do Trabalho: ao contrário do que se passa no procedimento comum do Código de Processo Civil, na Consolidação a petição inicial não é encaminhada ao juiz para despacho inicial.

De acordo com a norma do artigo 841 da Consolidação, a petição inicial é encaminhada ao diretor de secretaria, que designa a data da audiência e providencia a citação postal do réu. Apenas na audiência é que o juiz toma contato com a petição inicial. Diante dessa diferença de rito, a aplicação do artigo 285-A ao Processo do Trabalho ensejaria nulidade insanável por frustrar a tentativa de conciliação, que, à luz do escopo de pacificação social, é sempre mais desejável do que a sentença (Laurino, 2005).

Por outro lado, para os seguidores desta linha de raciocínio, a conclusão será outra se o objeto do processo envolver direitos indisponíveis, para os quais não se admite a conciliação. Por exemplo, em demandas fiscais promovidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social, onde já houve diversas ações idênticas, todas improcedentes. Nessa caso caberia porque a própria lei  impede a conciliação nos processos deste tipo.

Nestas hipóteses, a ausência de audiência não implicaria prejuízo aos litigantes e, portanto, não acarretaria nulidade (CLT, art. 794), pois o decreto liminar de improcedência traria a vantagem de impedir o emperramento da máquina judiciária com a sobrecarga ociosa de processos fiscais e o conseqüente retardamento da prestação jurisdicional nos processos que envolvem direitos alimentares derivados da relação de trabalho, que é a principal função da Justiça do Trabalho, o que não significa que a audiência seja prescindível em qualquer situação em que os direitos sejam indisponíveis.

Continuando, todos sabem que a audiência nos procedimentos da Consolidação não se destina apenas à tentativa de conciliação e à produção da prova oral. Ela é o eixo de um procedimento que enfatiza a oralidade com o objetivo de simplificar a disciplina do processo e conferir maior celeridade à prestação jurisdicional na Justiça do Trabalho. Mas no caso em comento, e apenas na hipótese de demandas repetitivas em que não cabe a conciliação e, claro, naqueles processos cujo rito especial não a comporta, como é o caso do mandado de segurança, torna-se possível prescindir da audiência. Afora isso, para se garantir a celeridade, deve-se concentrar na audiência o maior número possível de atos processuais, mesmo que a lei não permita a conciliação.     

Conforme leciona Laurino, uma crítica que pode ser dirigida a esta corrente consiste na  solução diversificada para situações semelhantes, pois, ao pé da letra, ou o artigo 841 é aplicável para todas as situações, ou pode ser afastado de acordo com a interpretação do juiz em cada caso, já que não só os direitos da Fazenda Pública são irrenunciáveis, mas também os direitos trabalhistas.

Na verdade, o que o artigo predispõe é que caberá ao juiz julgar a improcedência de plano, com base em jurisprudência própria, na qual, certamente, apreciará a questão da irrenunciabilidade, ou não do direito das partes, dispensando a citação.

Por todos os argumentos do aludido professor, poder-se-ia concluir, até por segurança jurídica, que o artigo 285-A do CPC não seria compatível com o Processo de Conhecimento Trabalhista, em decorrência da previsão do artigo 841 da CLT, ou que é aplicável, mas apenas em determinadas situações, a critério do Juízo.

No mesmo sentido podemos citar a já mencionada ADI 3695, proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil junto ao Supremo Tribunal Federal, a qual gera severas críticas a esta inovação, lato sensu.

Por outro lado, temos a corrente favorável a tal novidade, consubstanciada por decisões dos tribunais brasileiros, das quais faço um pequeno levante, bem como serão exibidas no decorrer do presente debate. Senão vejamos:

De acordo com esses, o artigo 285-A do CPC autoriza o Juiz, quando a matéria abortada na lide for exclusivamente de direito, julgar de plano a demanda, dispensando a citação do réu, desde que já tenha proferido sentença de improcedência em outras ações em que se verifique identidade na causa de pedir, evitando a execução de atos processuais dispensáveis, garantindo a celeridade e a economia processual – aplicando subsidiariamente o Código de Processo Civil na seara Trabalhista, conforme leciona o artigo 769 da CLT.

Referem-se ao ilustre professor Salvador Franco de Lima Laurino, que faz algumas ponderações, já apontadas, sobre a utilização do referido artigo, alegando que seria possível o uso deste comando apenas em ações de matérias repetidas em que não cabe conciliação – pois considera a falta de audiência para a tentativa de conciliação uma ofensa aos princípios trabalhistas.

Afirma, inicialmente, que deve o artigo 285-A ser aplicado na Justiça Trabalhista, principalmente por esta Especializada primar pela celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.

A juíza Gisele Pereira Alexandrino do TRT 13ª Região afirma no RO 02716-2007-026-12-00-3 que os defensores da incompatibilidade do mencionado artigo na justiça laboral alegariam os argumentos de vedação ao acesso ao judiciário, supressão da conciliação, impedimento do contraditório, impossibilidade de ampla defesa, entre outros, estão equivocados.

A mencionada juíza afirma, ipsis litteris:

Aa Lei. 11.277 de 2006 acrescentou o art. 285-A ao Código de Processo Civil, que passou a vigorar (...). Em decorrência desse dispositivo, pode o juiz, quando a matéria abordada nos autos for exclusivamente de direito, julgar de plano a lide dispensando a citação do réu, desde que já tenha proferido sentença de improcedência em outras ações em que se verifique identidade na causa de pedir e pedido.

O dispositivo em comento tem a intenção de garantir a celeridade e economia processuais, evitando a execução de atos processuais dispensáveis quando o Magistrado já tenha se pronunciado pela improcedência em ações anteriores” (RO 02716-2007-026-12-00-3, TRT 13ª Região)

Complementa a julgadora, utilizando as palavras de Nery Jr.: a norma comentada é medida de celeridade e de economia processual, que evita a citação e demais atos do processo porque o juízo já havia decidido questão idêntica anteriormente. Seria perda de tempo, dinheiro e de atividade jurisdicional insistir-se na citação e na prática dos demais atos do processo, quando o juízo já tem posição firmada quanto à pretensão deduzida pelo autor.

Acrescenta, ainda, o mencionado autor:

 Nada obstante o CPC 285-A localize-se topicamente dentro do procedimento ordinário, do livro de conhecimento, a norma comentada tem natureza jurídica de regra geral de processo e procedimento, motivo pelo qual se aplica a toda e qualquer ação, independente da competência do juízo e do rito procedimental que de imprima à ação repetida. Assim, por ser aplicada a regra da improcedência da ação repetida nos processos de conhecimento, cautelar e de execução (...) é admissível a aplicação do CPC 285-A (...).

Refere-se, ainda, as seguintes decisões do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: Acórdão - Processo 0080100-93.2007.5.04.0701 (RO), Acórdão - Processo 0057500-78.2007.5.04.0701 (RO), Acórdão - Processo 0136100-16.2007.5.04.0701 (RO) , Nesses,  a Desembargadora Maria Inês Cunha Dorneles se pronuncia igualmente favorável ao uso do art. 285-A do CPC na seara do processo trabalhista. Senão, vejamos:

1.NULIDADE DA SENTENÇA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE.
MATÉRIAS IDÊNTICAS. PERMISSIVO DO ARTIGO 285-A do CPC O artigo 285-A do CPC permite o julgamento antecipado da lide, sem citação da parte contrária quando sobre a matéria discutida já houver pronunciamento de improcedência.
Dos termos do recurso, na fl. 53, possível identificar que o recorrente pretende a anulação do julgado, porquanto, apesar de admitir que a matéria é idêntica, sustenta que não são iguais as pretensões.
Mas não lhe assiste razão.
Perfeitamente admissível o procedimento adotado, porquanto os pedidos são de diferenças salariais, em razão do reconhecimento de que devido o implemento da progressão horizontal por antiguidade, sendo que há identidade quanto ao postulado, relativamente à referência salarial de 2008, como a própria parte anuncia em recurso.
Nada há, portanto, a macular a decisão originária, quanto ao aspecto ventilado, merecendo exame a matéria de fundo.
Inexistente violação aos dispositivos legais lançados no recurso: artigo 5º, caput, inciso I, LIV, XXXV e LV da Constituição Federal, todos articulados para dizer da inconstitucionalidade do artigo 285-A do CPC.
Nega-se.


Com efeito, então, o aludido artigo deveria ser aplicado na Justiça do Trabalho, especialmente pelo fato de que o processo trabalhista prima pela celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.

Continuando, não se vislumbraria a incompatibilidade do referido artigo pela falta da tentativa de conciliação, uma vez que nesses casos o magistrado já tem o posicionamento sobre a matéria, já firmou seu convencimento, já sabendo de forma antecipadamente como vai julgar o caso – dessa forma não haveria necessidade para a movimentação do judiciário, oneração do processo e todos os demais atos processuais inerentes – afinal a economia e a celeridade são princípios do mesmo modo. Por mais que houvesse a possibilidade do acordo, que restaria evidentemente prejudicada, o juízo já teria seu entendimento, mais benéfico para o hipossuficiente, consubstanciado.

O juiz Luiz Roberto Nunes, coordenador de seminário sobre o tema no TRT da 15ª Região firmou posição pela aplicabilidade do referido artigo, pregando ainda sua constitucionalidade incondicional.

Na verdade a corrente favorável das decisões apenas trata como regra o que é tratado como exceção pelos defensores da incompatibilidade.

Entretanto, esse posicionamento, muito embora amparado por decisões dos nossos tribunais brasileiros, se mostra mais frágil perante todo o ordenamento jurídico trabalhista que em regra repudia o uso do mencionado artigo, respeitando, é claro, suas exceções. Vale frisar, novamente, que dependeria, além do cumprimento de todos os requisitos, até alguma outra mudança legislativa, do juízo de primeiro grau ser favorável a tal aplicação o que não vem sendo muito comum.

Vale frisar que a utilização do Art. 258-A do CPC na Justiça Comum vem sendo usado, não raramente, de maneira errônea pelos juízes: eles criam sua própria jurisprudência para se vincular, e transformam as sentenças em gráficos, sendo a improcedência apenas mais um processo resolvido com resolução de mérito pelo juiz, cumprindo assim as metas de eficiência impostas pelos Tribunais. E isso é inadmissível.

Sobre o tema foram efetuadas duas entrevistas com as Juízas Titulares das duas Varas do Trabalho da Comarca de Bagé-RS (autorização em anexo), as quais apesar da realidade comum em que dividem, posicionam-se de maneira relativamente diferente à matéria, entretanto espelhando toda a divergência apontada no presente trabalho.

Foi feita a seguinte pergunta: Você concorda com a utilização do artigo 285-A do CPC no processo trabalhista? Porquê?

Sobre o tema foi respondido oralmente pela magistrada Rosane Marlene Lemos, juíza titular da 1ª Vara do Trabalho de Bagé-RS, ipsis litteris:

“Entendo inaplicável na Justiça do Trabalho o artigo 285-A porque o artigo 860 da CLT diz que recebida e protocolada a representação na forma devida vai ser designada a audiência de conciliação, sendo assim, se eu indeferir de plano a petição inicial, julgando improcedente a ação, eu posso estar evitando uma conciliação, o que no processo trabalhista não é o mais correto. Eu procuro sempre valorizar a conciliação”.

Deixou claro a magistrada que não concorda com a utilização do mencionado artigo na Justiça Laboral, pois entende afrontar as rotinas trabalhistas e os princípios característicos desta especializada.

Por outro lado, a magistrada Rosâne Marly Silveira Assmann, juíza titular da 2ª Vara do Trabalho de Bagé-RS, de forma escrita afirma o seguinte:

“O artigo 285-A do CPC prevê a possibilidade de prolação de sentença sem a citação do réu quando a matéria for exclusivamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos.
Há necessidade de que a matéria debatida seja exclusivamente de direito, não envolvendo dilação probatória. A decisão anterior de improcedência deve ser do próprio Juiz que utiliza o artigo 285-A.
É possível a aplicação de mencionado artigo na Justiça do Trabalho. Todavia, a aplicação é restrita porquanto a matéria debatida nas ações ajuizadas nesta Justiça Especializada geralmente envolve questões fáticas. Mesmo quando não há necessidade de prova oral, é necessária a análise de prova documental, normalmente trazida pela parte ré”.


Sendo assim o caso local reflete toda a divergência sobre o tema que ainda não é pacífico. Pode-se afirmar, sem medo de errar, que em regra não será possível o uso do aludido artigo na Justiça Laboral. Entretanto, deve-se conhecer as exceções a regra, para eventuais casos concretos em que sejam suscitadas tais possibilidades. Frisando que o juiz é que decidirá se aplicará o artigo ou não, pois até o presente momento não há no ordenamento jurídico nenhum impedimento formal para o presente procedimento.

CONCLUSÃO

Inicialmente afirma-se que a alteração legislativa é constitucional na acepção do termo, ou seja, ela esta em completa consonância com a nossa Carta Maior, com toda a vênia merecida aos nobre discordantes. Entretanto a problemática surgida e apresentada para debate neste artigo foi a respeito da aplicabilidade da referida alteração legal, qual seja, o art. 285-A do CPC, no processo trabalhista.

A solução adotada tem em vista um fim meritório, qual seja, efetivar a celeridade processual, trazendo à população em geral uma sensação de que a Justiça está respondendo com eficiência as demandas levadas ao poder judiciário.

Mas, no caso em comento, ainda mais em se tratando de Justiça do Trabalho, com toda a vênia merecida aos julgadores que discordam da conclusão ora apresentada, os julgadores foram longe demais na tentativa de acelerar o processo judicial trabalhista.

Sob o pretexto de propiciar desfecho imediato para o processo, nesses casos, evitando a prática de atos ditos por “inúteis”, ou a repetição de ações na qual supostamente o juízo já tem a resposta imediata pronta (em tese), o dispositivo feriu gravemente o direito de ação,  fez pouco caso dos princípios processuais, bem como das rotinas trabalhistas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho, sem cuja observância impossível de falar em devido processo legal.

Quanto às partes que efetivamente não tem o direito de fazer acordos, nem mesmo nesses casos poderia haver a improcedência de plano, pois o autor prejudicado tem o direito de levar o seu caso ao juízo para buscar a solução de uma lide que prejudica seus interesses. Frisa-se que o direito do particular estaria agredido em primeira instancia que é onde efetivamente se instrui a ação, se mostra as particularidades do caso concreto e se pode comprovar o alegado. Muito embora o posicionamento possa já estar delimitado, a parte autora tem o direito de instruir a ação, de ver os documentos requeridos na inicial serem juntados ao processo, entre tudo o mais.

Vale ressaltar, mais uma vez, que os ritos previstos na CLT são diferentes dos ritos do processo comum, e a uso do 285-A do CPC acabaria criando confusão e, até mesmo, mais trabalhos cartorários, a fim de distinguir os processos que iriam conclusos antes da audiência (rito não previsto na prática trabalhista) ou os que seguiriam o rito normal, qual seja, encaminhamento da petição inicial para o diretor de secretaria, que vai marcar a audiência e providenciar a notificação das partes.

Seja por essa incompatibilidade de ritos, ou por todos os argumentos supramencionados, conclui-se pela não aplicabilidade do referido dispositivo uma vez que esse procedimento garantiria a eficiência e a verdadeira justiça dentro da pratica laboral.

Posto isso, confirma-se a conclusão pela não aplicabilidade do art. 285-A do CPC na prática trabalhista, pois esta particularidade do processo cível fere os princípios e bases da pratica trabalhista, bem como vai de encontro com os procedimentos previstos na legislação laboral.

Ainda, deve-se trazer uma sugestão aos operadores do direito que utilizam do Art. 285 do CPC na Justiça do Trabalho: se a justificativa é realmente a celeridade processual que os nobres juízes passem a respeitar os horários das pautas, otimizar os serviços cartorários e menos paralisações coletivas, garantindo assim o melhor aproveitamento do tempo de serviço e das audiências, repercutindo no andamento dos processos.

COMO CITAR ESSE ARTIGO: TAVARES, Rodrigo Ungaretti. Revista Justiça do Trabalho. Abril 2011, p. 54-64. Porto Alegre: HS Editora, 2011.
REFERÊNCIAS


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BARROS, Alice Monteiro de. A nova competência jurisdicional à luz da Emenda Constitucional n.45, Revista do TRT/3ª Região nº. 71 de janeiro/junho de 2005. Material da 2ª aula da Disciplina Reflexos da Reforma do CPC e da EC 45, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-Uniderp| REDE LFG.

BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Curso de Direito Processual do Trabalho. 3ª edição. São Paulo: LTr, 2005.

CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 34ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.

LAURINO, Salvador Franco de Lima. Os reflexos das inovações do Código de Processo Civil no Processo Trabalhista. Ver. Trib. Reg. Trab. 3ª Região, Belo Horizonte, v. 42, n. 72 p. 79-89, jul./dez.2005. Material da 3ª aula da Disciplina Reflexos da Reforma do CPC e da EC 45, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-Uniderp – Rede LFG

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 20ª Edição.São Paulo: Editora Atlas, 2004.

MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual Esquemático de Direito e Processo do Trabalho. 17ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008.

PIRES, Eduardo Rockenbach. O pronunciamento de ofício da prescrição e o processo do trabalho. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11280. Acesso em 05.01.2010. Material da 1ª aula da Disciplina Reflexos da Reforma do CPC e da EC 45, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-Uniderp| REDE LFG.

PRATA, Marcelo Rodrigues. O “novissimo” Processo Civil e o Processo do Trabalho — Uma outra visao. Revista LTr, 71- 03/283. Material da 3a aula da Disciplina Reflexos da Reforma do CPC e da EC 45, ministrada no Curso de Pós- Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Direito e Processo do Trabalho – Anhanguera-Uniderp| REDE LFG.

ZIMMERMANN NETO, Carlos. Processo do Trabalho. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008.





[1] Rodrigo Ungaretti Tavares é Advogado, Bacharel em Direito pela Universidade da Região da Campanha, Especialista em Direito e Processo do Trabalho Lato Sensu, pela UNIDERP-ANHANGUERA, Conciliador do Juizado Especial Criminal da Comarca de Bagé-RS (Diário da Justiça Eletrônico de 29/10/2010-Boletim n°27.018), membro da Comissão do Jovem Advogado de Bagé-RS, Conselheiro Fical da OABPREV/RS.

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